Sérgio Espírito Santo foi o treinador convidado para a rubrica 'Entrevista Com', um exclusivo do A Bola é Redonda. Ao serviço do São Pedro da Cova, o jovem técnico conseguiu que a equipa se apurasse para a Divisão d'Elite Pro Nacional na próxima temporada. Numa época onde aconteceu de tudo, terminar na quinta posição foi uma tarefa só ao alcance dos melhores e ao longo desta entrevista, que terá algumas respostas mais longas, mas que se justifica com a necessidade de se perceber a realidade do futebol distrital no seu mais puro estado, o técnico irá explicar tudo.
Não deixe de ler mais uma excelente entrevista em mais um exclusivo do A Bola é Redonda.
Plantel do São Pedro da Cova que iniciou a época 2012/13 |
A Bola é Redonda (ABR) - Mister, gostava que me fizesse um balanço da época do São Pedro da Cova.
Sérgio Espírito Santo (SES) - O balanço da época não podia ser mais positivo. Foi-me pedido pela direcção a manutenção o mais depressa possível, para evitar os sobressaltos dos finais de época, o que veio a acontecer. A subida à divisão d'Elite Pro Nacional foi a cereja no topo do bolo.
ABR - Sei que houve muitas dificuldades durante a época, mas ainda assim a equipa andou nos lugares do cimo da tabela. Como foi possível?
SES - Em poucas palavras não consigo passar as dificuldades todas da época. Sendo assim passo só a descrever algumas delas. A época não foi bem estruturada desde o inicio, nem a nível directivo nem na formação do plantel. Já que com os problemas financeiros que esta direcção herdou, os subsídios disponíveis obrigaram-me a ter que formar o plantel com os jogadores da época transacta e procurar que os novos atletas fossem de perto, para evitar despesas aos mesmos. Fizemos captações de ex-juniores de outros clubes, contratamos atletas sem conhecimento do valor destes, mas sim por referências de colegas. Ficamos mesmo no plantel com atletas que já estavam parados a algum tempo.
Durante a época tivemos vários problemas desde o balneário que era os atletas da casa e os outros de fora. Atletas que nem sempre treinavam com o grupo por motivos profissionais. Um atleta que se ausentou durante três semanas para jogar futebol de rua pela selecção Portuguesa. Dispensas de atletas por falta de regras ou responsabilidade. Atletas que por falta de cumprimento deixaram o clube em várias alturas da época. Jogadores que, à falta de cumprimento do subsidio no dia estipulado, já não treinavam. Falta de luz durante a semana para treinar. Os últimos três meses treinamos em média com 10 jogadores mais alguns que treinavam para manter a forma, inclusive, jogamos com atletas que não treinavam, ora por motivos profissionais ora por falta de respeito com colegas. Jogadores da formação que, ora treinavam e logo de seguida desapareciam. Mais teria a dizer, mas são muitas as historias que fico-me por aqui.
Esta classificação só foi possível graças ao valor dos atletas, que quer se queira quer não, o treinador não faz milagres se não existir valor nos atletas. O treinador não ensina mas sim melhora as potencialidades do atleta. A um grupo restrito de jogadores, que foram uns heróis, na qualidade quer humana quer futebolística, mas acima de tudo e com tantos problemas na assiduidade. Este grupo de cerca de 12 atletas estiveram sempre presentes, mesmo nas dificuldades. Ao trabalho da equipa técnica que com muita, mas muita paciência, teve que fechar os olhos a tantos obstáculos que fomos encontrando durante a época, para que o objectivo pessoal da subida ao escalão superior fosse possível. Não deixo de dar valor à direcção por tentar com todas estas dificuldades que encontraram, enfrentarem esta época desportiva. Para eles esta subida também é um prémio merecido. Como dizia várias vezes em conversa com o meu adjunto, colaborador, observador, conselheiro, amigo e solidário Paiva, como é possível nós a tentarmos trabalhar bem e a treinarmos mal, temos estes resultados. Imagine-se se trabalhássemos bem. Deixo esta mensagem no ar...
ABR - Depois de uma época desgastante, o São Pedro da Cova consegue a promoção à Divisão d'Elite Pro Nacional. Que comentário lhe merece essa promoção?
SES - O comentário que posso fazer é que não chega ter grandes orçamentos, muitos e grandes jogadores, ou jogadores experientes. O que me deixa orgulhoso nesta subida, e já vão três em cerca de 6 anos como treinador principal, é que com um plantel tão curto em quantidade e qualidade, com uma média de idades a rondar os 22 anos, com jogadores a fazer a primeira e segunda época de seniores e logo nesta divisão, subir é gratificante. Ao longo das semanas passei sempre a mensagem que se formos organizados, disciplinados, solidários e, acima de tudo, ambiciosos a subida era possível. Lutamos contra grandes equipas, com orçamentos elevadíssimos mas, no fim, a subida foi nossa e num honroso quinto lugar.
ABR - Porem, essa promoção chegou a estar em risco devido às alterações que a AF Porto quis fazer depois do final do campeonato. Como viu essa situação?
SES - Isso só foi possível porque o jogo de interesses da Associação, e determinados clubes, vem sempre ao de cima. O regulamento da competição é estipulado no inicio e não no fim dos campeonatos. Se havia determinadas vagas para preencher com as equipas da divisão de honra é assim que devia ficar. Todas as equipas, e nós não fugimos à regra, foram efectuando os jogos a controlar a pontuação. Posso dizer que eu, com a falta de recursos humanos, jogava para os pontos e consequente classificação. Não tinha armas para atacar ao menos defendia-me. Por isso só me deu motivo de riso ver que no futebol tudo é possível.
Festa da subida pelo Sousense, depois de vencer a Divisão de Honra da AF Porto |
ABR - Acha que o alargamento para 22 clubes foi a decisão mais acertada?
SES - Por muito que goste do futebol e de competição, não concordo e acho que não foi a decisão mais acertada.
ABR - A próxima temporada será ainda mais desgastante do que esta, visto que a Divisão d'Elite ao ter 22 clubes, isso traduz-se em 42 jornadas. Acha que um campeonato distrital pode comportar tantos jogo?
SES - Na minha opinião, a Divisão de Honra deveria só ter 18 equipas. Justifico com o facto de 42 jornadas mais a Taça de Portugal, passarem a ser muitos jogos para um atleta/trabalhador/estudante.Tal como vai obrigar os clubes a aumentar as suas despesas na construção do plantel em quantidade para enfrentar a desgastante época desportiva.
ABR - Mister, sei que não vai continuar no São Pedro da Cova. Que motivos o levam a deixar o clube?
SES - No final de época, com o desgaste da mesma e com todos os problemas que dela surgiram, a probabilidade de continuar era muito reduzida. Os motivos para não continuar no clube eram e são alguns que descrevo e outros que não referenciei. De qualquer forma, como se diz no futebol, o que hoje é verdade amanhã é mentira. Reflecti e ainda existe a possibilidade de continuar no clube. Para isso está marcada uma reunião com o Presidente para abordarmos a próxima época.
ABR - Já tem algum projecto em vista ou o telefone ainda não tocou?
SES - Até agora só me foi apresentada uma possibilidade para um novo projecto mas não veio a concretizar-se. Quando me coloca a questão se o telefone ainda não tocou, eu questiono-me.
Para quem tem poucos anos de treinador, já tem três subidas de divisão, inclusive campeão da Divisão de h
Honra, uma presença na 3ª Divisão Nacional, ficando na fase de subida. Na Divisão de Honra conquistei sempre um lugar nos cinco primeiros classificados. Abaixo desse lugar só a época passada na 1ª Distrital, no Leverense, em que alcançamos o 10º lugar. Eu pergunto a mim mesmo, "não merecia ser contactado?" Mas infelizmente isso não tem acontecido, com pena minha. Se calhar o telefone não toca, porque eu tenho um grande defeito comigo mesmo. Até à data de hoje nunca liguei para os presidentes, directores a oferecer-me, por isso é que o telefone não deve tocar.
Sérgio Espírito Santo já subiu por três vezes nos últimos seis anos |
ABR - O que espera que o clube faça na próxima temporada, num campeonato muito competitivo como será a Divisão d'Elite?
SES - O que espero que o clube faça na próxima época é que tenha mais estabilidade, quer financeira quer a nível de recursos humanos. O campeonato vai ser difícil, o que obrigará o clube a estruturar-se bem para poder fazer um bom campeonato. esse é o meu desejo.
ABR - Por último, gostaria que deixasse algumas palavras aos adeptos do São Pedro da Cova e aos leitores do blog.
SES - Ao leitores do Blog: Quero deixar uma palavra de apreço a todos os leitores sem excepção por acompanharem o mesmo. Sem vocês os nossos comentários e opiniões não faziam sentido. O futebol com menos dimensão jornalística é passado aqui pelo amigo Johnny Lino de uma forma esclarecida. A todos um bem haja. Aos sócios do São Pedro da Cova, que são adeptos fervorosos, quero dizer que nem sempre apoiaram estes jovens atletas como eles mereciam.Com o apoio de todos os sócios e simpatizantes, esquecendo o passado e colaborando no presente e futuro, o São Pedro da Cova pode e deve voltar a ser credível e uma referência de clube da Associação de Futebol do Porto. Ao meu caro amigo Johnny Lino, tenho a agradecer todo o seu trabalho em prol do futebol distrital, onde estou mais inserido. Agradecer a possibilidade de poder descrever o meu trabalho, as minhas opiniões e mostrar que nos escalões inferiores também é possível trabalhar bem. É com enorme prazer que ouço/leio os seus comentários.
A administração do A Bola é Redonda, na pessoa do seu fundador, agradece a disponibilidade a Sérgio Espírito Santo para responder a este questionário.
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