16 de julho de 2007

BRASIL À EUROPEIA


BRASIL - ARGENTINA 3 - 0
Final da Copa América 2007
15 de Julho de 2007
Estádio Pachencho Romero (Maracaibo)
Árbitro: Carlos Amarilla (Paraguai)
Brasil: Doni; Maicon, Alex, Juan, Gilberto; Mineiro, Elano (Daniel Alves 33'), Josué, Júlio Baptista; Robinho (Diego 89'), Vágner Love (Fernando 88'). Tr: Dunga
Argentina: Abbondanzieri; Javier Zanetti, Ayala, Gabriel Milito, Heinze; Mascherano, Verón (Lucho González 65'), Cambiasso (Aimar 58'), Riqueleme; Tévez, Messi. Tr: Alfio Basile
Ao intervalo: 2 - 0
Marcadores: 1 - 0 Júlio Baptista 4', 2 - 0 Ayala 40' pb, 3 - 0 Daniel Alves 68'
CA: Alex 36', Mascherano 41', Doni 50', Gilberto 54', Júlio Baptista 66', Tévez 75', Josué 81'



O Brasil venceu a pobre Copa América pela quinta vez nos últimos dez anos, acentuando ainda mais o seu domínio no panorama do futebol sul-americano. Na final, a selecção canarinha deu uma imagem bem diferente da que patenteou durante toda a competição e, contra todos os prognósticos, derrotou a poderosa Argentina por claros 3 - 0.
Dunga e Basile apresentaram para o jogo decisivo dois sistemas semelhantes, assentes num 4-4-2 em losango no meio-campo. Ambos os losangos constituídos por um médio-defensivo (Mineiro e Mascherano), dois interiores, dos quais um (Josué e Cambiasso) mais conservador que o outro (Elano e Verón) e um médio-ofensivo (Júlio Baptista e Riquelme). Com os dois esquemas perfeitamente encaixados no sector médio, tornava-se evidente que, para além da dinâmica colectiva e da própria inspiração individual dos jogadores, quem conseguisse catapultar os seus laterais com mais intensidade para o ataque, poderia levar vantagem sobre o rival. Ora Maicon e Gilberto fizeram exibições de grande nível, o mesmo já não se poderá dizer de Zanetti e Heinze...
Apesar de o 'escrete' ter estado melhor e ter justificado inteiramente a vitória, a verdade é que a sorte esteve do seu lado, pois começou o desafio praticamente a ganhar e pode agradecer a Deus não ter consentido o empate logo a seguir. Aos 4 minutos, Maicon lança longo para Júlio Baptista que se desembaraça de Ayala e atira cruzado para as redes de Doni. Um grande golo que poderia ter sido imediatamente anulado, mas Riquelme atirou ao poste, após bela iniciativa de Messi e assistência de cabeça de Verón. Dizem que Deus é brasileiro e pela amostra começo a acreditar seriamente nessa possibilidade (não esquecer a meia-final frente ao Uruguai através das grandes penalidades).
A Argentina tem então um período em que se instala no meio terreno contrário, embora sem nunca conseguir ser perigosa nem mostrar um futebol ligado e fluído. Vivia apenas de algumas arrancadas de Messi, que também cedo mostrou não estar nos seus melhores dias. Mas mesmo este domínio territorial foi sol de pouca dura. A partir do quarto de hora, o Brasil começa positivamente a mandar no jogo. Revelando grande maturidade táctica, controlo emocional, superior solidariedade colectiva e maior entrega ao jogo e vontade de vencer, talvez espicaçados pela crítica feroz de que foram alvo, os comandados de Dunga arrancaram para uma exibição inteligente e pragmática, bem ao estilo do que hoje exige o futebol moderno, bem à imagem do futebol europeu virado para o resultado. Mineiro secava Riquelme, Elano e Josué exibiam grande disponibilidade para percorrer quilómetros no meio-campo e os laterais Maicon e Gilberto aproveitavam as autênticas avenidas abertas pela passividade adversária. Os argentinos denotavam lentidão, não pressionavam convenientemente o portador da bola, pelo contrário, eram eles os próprios a serem envolvidos pelos brasileiros, levando ao desaparecimento progressivo de homens como Riquelme, Messi ou Tévez. E quando o conjunto não funciona, não há ligação entre os diferentes sectores, parece que existe um espaço enorme entre cada elemento, cada um votado à sua sorte, sem apoio nem alternativa, por mais que a sua vontade seja a de ajudar a equipa.
Quando o jogo estava morno, sem grandes oportunidades de golo e com poucos motivos de interesse, Riquelme resolve dar um pontapé na monotonia e lá conseguiu criar um momento de aperto junto da baliza canarinha, com um belo remate à entrada da área, tendo valido a apurada elasticidade de Doni. Todavia, pouco depois, com a eficácia de que já falei, o Brasil aumenta para 2 - 0 e dá mais uma machadada na confiança alvi-celeste. E foi logo com um autogolo de Ayala para a depressão ser ainda maior. Mérito para o cruzamento de Daniel Alves, entretanto entrado para o lugar de Elano, e que se revelou uma aposta ganha do técnico brasileiro.
Chegou o intervalo e reclamei para mim a entrada de Crespo, na tentativa de abrir a frente de ataque argentina. A perder por duas bolas, era hora de Basile arriscar tudo para os derradeiros 45 minutos e alterar o sistema para uma matriz mais arrojada. Mas tal não aconteceu e o onze argentino manteve-se o mesmo para a segunda metade! Primeiros dez minutos e nada de novo aconteceu: Argentina perdida e desligada, Brasil motivado, dono e senhor do jogo. Cambiasso e Verón eram incapazes de assegurar a transição ofensiva, Riquelme jogava completamente parado e era engolido pelos incansáveis brasileiros. Aliás, abro aqui um parênteses para dizer que está justificado o facto de o melhor jogador a actuar na América do Sul não ter vingado numa equipa de topo europeu como o Barcelona e ter tido necessidade de descer para o Villarreal. O homem está desfasado daquilo que é o futebol actual, brilha no continente americano pois lá joga-se um futebol sem velocidade, onde importa a capacidade técnica e nunca a dinâmica e velocidade de jogo.
Aos 58 minutos, o seleccionador argentino, que nunca antes havia perdido um encontro da Copa América, lá se decidiu por lançar sangue novo na sua equipa: troca Cambiasso por Aimar e, mais tarde, Verón por Lucho). Apesar de ter conferido um cariz ligeiramente mais ofensivo ao seu conjunto, o certo é que Basile trocou jogadores de posições idênticas e não alterou o sistema, mantendo o 4-4-2, quando a meu ver se impunha um 4-3-3 com Tévez, Crespo e Messi na frente, ou mesmo um 3-3-4 com o acrescento de Diego Milito pela saída de um defesa (possivelmente o desastrado Gabriel Milito, já que Heinze fecha bem ao meio). Não foi o que aconteceu e a Argentina nunca se encontrou, tendo realizado uma péssima exibição durante todo o segundo tempo. O Brasil apostava agora em contra-ataques rápidos e sempre venenosos. Num deles, o mal-amado Vágner Love isola Daniel Alves com uma assistência soberba, tendo o (ainda) sevilhano desferido um certeiro remate ao poste mais distante. 3 - 0!
Pouco depois, o apito final do paraguaio Carlos Amarilla. A inteligência quase científica da selecção de Dunga, o pragmatismo, a eficácia e a mentalidade vencedora imposta aos jogadores canarinhos (qual equipa europeia), acabavam de arrasar a melhor selecção da Copa América, quer em futebol jogado até aí, quer em quantidade de estrelas por metro quadrado. A forma como o Brasil se exibiu fez-me lembrar o FC Porto campeão europeu de José Mourinho e não foi em vão. O Brasil fez a festa justamente. O portista Helton, mesmo sem ter actuado, e o prodígio Anderson são campeões sul-americanos. Um título de importância relativa quando comparado com o título europeu ou mundial, mas com certeza muito saboroso para a selecção brasileira, mais a mais olhando aos incessantes ataques de que foi vítima pelos seus próprios compatriotas dos mais diversos quadrantes. A Argentina foi a melhor equipa presente na Venezuela, mas o Brasil é o campeão, com Robinho a ser o melhor jogador e o melhor goleador com 6 tentos apontados. E o que é que fica para a história?

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