2 de abril de 2011

Entrevista com: Armindo Lobato (Presidente demissionário do Coimbrões)

Na passada sexta-feira, dia 25 de Março, a direcção do Coimbrões demitiu-se em bloco, como manifestação contra a falta de apoio por parte da Câmara de Gaia, relativamente à falta de condições do Parque Silva Matos que começa a ser curto, para a ascensão que o clube tem sofrido nas últimas temporadas. A direcção do único clube gaiense a ser Campeão Nacional deu assim um murro na mesa, numa altura em que o clube está practicamente a garantir a manutenção na 2ª Divisão Nacional.
O 'A Bola é Redonda' quis saber quais os motivos concretos que levaram a direcção a demitir-se e falou com o Armindo Lobato, que recebeu cordialmente o administrador deste espaço na sala de troféus do clube onde decorreu uma conversa amena, focando vários pontos da vida do clube para além desta temporada. Armindo Lobato abordou sem problemas o caso que ainda ensombra o clube, referente à temporada 2008/2009, no célebre jogo com o Serzedelo, em que o dirigente José Rocha Ribeiro e o antigo treinador António Remelgado foram acusados de tentar subornar o árbitro do jogo da última jornada, afirmando que está "praticamente provada a inocência do clube" e que "as pessoas referidas confessaram o seu envolvimento", ressalvando que o clube não deverá sofrer nenhuma consequência grave.
Esta é mais uma entrevista exclusiva do 'A Bola é Redonda' e que vale a pena ser lida.


Armindo Lobato ao lado da Taça de Campeão da 3ª Nacional conquistada o ano passado


A Bola é Redonda (ABR) - A equipa está no sexto lugar, mas chegou a andar pelos primeiros lugares. Era o que estava à espera para esta temporada?

Armindo Lobato (AL) - Era uma incógnita quando começou o campeonato, não estávamos habituados, não tínhamos experiencia de 2ª Nacional e tínhamos alguma dificuldade em programar a época. Entretanto, ela correu bem, tem corrido bem, estamos em sexto lugar, mas podemos ficar em qualquer outra posição, temos é que fazer mais três ou quatro pontos para estarmos mais seguros. Penso que o objectivo está conseguido, a permanência, aliás os nossos adversários não contavam connosco e se calhar tinham alguma razão, pois não lutamos com as mesmas armas, uma vez que têm outras ajudas, outra capacidade e outros meios que nós não temos. Há dias vinha uma reportagem de um jornal diário e falou nos clubes desde o primeiro ao sexto classificado, mas passou por cima do Coimbrões e nos estávamos em terceiros. As pessoas já sabiam qual era o nosso objectivo. O nosso objectivo nunca foi subir nem podia ser, este clube não pode, enquanto tiver os apoios que tem e as infra-estruturas que tem, mesmo que pensasse numa situação dessas. Teria que haver um projecto muito forte, tinha que ser a nível de Gaia, no sentido de haver uma equipa a nível de Vila Nova Gaia. Só assim é que podia ser feito. Pelo Coimbrões só, não é possível, pois estamos a falar do profissionalismo.


ABR - Em quatro anos o Coimbrões passou dos escalões distritais para as divisões nacionais. Qual foi a receita?

AL - Foi a gratificação do trabalho desenvolvido ao longo de 15 anos, com uma organização sempre certinha. Com o avizinhar da crise, nos mantivemos sempre a mesma situação, estávamos conforme estamos, agora com um pouco mais de dificuldades, pois a 2ª Divisão tem outra exigência, não em termos de ordenados e subsídios, porque continuamos a ser amadores, mas sim em termos de organização, deslocações e estadias, pois ficam mais caras. Uma multa que na AF Porto custava 100€ agora custa 2000€. É diferente, já é um outro campeonato, é o maior campeonato amador nacional. Temos que saber habituar-nos, o clube cresceu muito e a sua massa associativa também tem que crescer, assim como a capacidade dos dirigentes também tem que crescer. Senão acompanharmos esse crescimento não será possível fazer mais do que isto e penso que atingimos aquilo que a maior parte das pessoas não pensava que pudéssemos atingir.


ABR - Fala da falta de ajudas e é esse o motivo que o leva a demitir-se. Que ajudas é que estava à espera de ter e não teve?

AL - Criou-se um ruído muito grande em torno da demissão. Primeiro, porque foi pela derrota com o Boavista. Quero dizer que a nossa demissão acontece na sexta-feira antes, em Assembleia Geral. Falou-se também pelos resultados apresentados nessa Assembleia, que foram negativos. Quero dizer o seguinte. Não tem nada a ver. Apresentamos um passivo grande, para aquilo que é normal, mas fizemos um investimento de cerca de 200 mil euros e hoje, desse investimento, devemos pouco mais de 20 mil euros ao banco e temos uma conta que perfaz a importância do nosso balanço e que temos que acertar com o nosso fornecedor de equipamentos que está em França. Isto é público, porque o nosso balanço é público, legal e correcto. As pessoas começaram a falar coisas que não tinham nada a ver, mas não, tem de facto a ver com a falta de apoio. Quando digo isto, sendo eu uma pessoa ligada à área financeira, infelizmente tenho que compreender que tudo está mal, está o país, as autarquias, estão os clubes, estão as famílias, está tudo mal. Mas o mundo não pode parar e como não pode parar, há muitas maneiras de se apoiar financeiramente, através de um patrocínio, de uma amizade, que foi isso que conseguimos ao longo dos anos. Mas isso não é tudo, porque o clube está na 2ª Divisão Nacional e não tem condições para receber quem nos visita. Não temos uns balneários em condições, não temos uma bancada em condições. Temos gravíssimos problemas. Só no último jogo pagamos cerca de 1500€ de policiamento. Se calhar até vinha a mesma polícia, porque era um jogo de alto risco, mas nos outros jogos também temos cerca de 14 ou 15 polícias e quando jogamos fora, temos quatro ou cinco elementos. E porque? Porque nós não temos condições, porque os adeptos têm que passar por aqui e por ali. E por outro lado, o nosso relvado começa a estar fora do prazo, porque já fez os 10 anos. Este parque de jogos tem que levar uma volta. Ou então tem que se acabar com a actividade ou parte dela.


ABR - Mas referia-se, quando fala em acabar com a actividade, terminar com o futebol sénior?

AL - Exactamente. Não digo acabar, mas pelo menos diminui-lo, não sei. As pessoas têm que pensar bem, o clube tem que pensar bem, os associados têm que perceber que estas são as condições que tínhamos há dez anos e se tirarmos a relva eram as que tínhamos há 40 anos. Tivemos algumas negociações e alguns benefícios no campo, mas com uma bancada e com dois balneários e o posto médico por baixo, resolvíamos o problema do clube, o problema dos balneários, o problema da segurança, o problema de quem nos visita, porque assim teríamos onde coloca-los. Porque quem nos visita, tem que ter condições, os clubes deveriam de dar condições mas infelizmente não dão a quem paga o bilhete na bilheteira, porque são eles que nos dão as receitas dos jogos, mas os dirigentes infelizmente não pensam nisso. Sempre disse que para chamar adeptos, primeiro tinha que haver motivação, segundo, haver condições para os colocar. Por exemplo, houve muita gente que não veio ver o futebol o domingo passado contra o Boavista, porque sabiam que não tinham condições de segurança e tinham medo.


ABR - Com certeza, já expos essas situações ao Presidente da Câmara ou ao Vereador do Desporto. Quais foram as respostas que obteve?

AL - Olhe, tivemos uma reunião com o Senhor Presidente da Câmara há cerca de dois meses para o alertar do que estava a acontecer. Nós vamos a todo o lado e vamos representar Gaia, vamos a Ponte de Sor, Tondela, vamos a todo o lado. Quem é o Coimbrões? Vila Nova de Gaia. Portanto nos representamos Gaia e penso que o temos feito bem, dentro das possibilidades que temos. Avisei-o ou pelo menos tive o cuidado de transmitir as dificuldades que estávamos a passar, a falta de condições que tínhamos. Disse que efectivamente ia tentar arranjar uma solução que nos pudesse ajudar a minimizar esta situação, mas não aconteceu. Como tivemos a Assembleia Geral, avisei o Presidente da Assembleia onde também ia estar o presidente da junta de Santa Marinha e disse-lhes que se até lá nada se tivesse alterado, lamentava, mas a direcção força-me e eu também estava totalmente de acordo a apresentarmos a nossa demissão e foi isso que aconteceu.

Armindo Lobato reclama por mais apoios da Câmara e teme pelo futro do clube


ABR - A demissão foi apresentada e é uma decisão irreversível portanto..

AL - A demissão é irreversível, porque foi apresentada em Assembleia Geral. O Sr. Presidente da Assembleia Geral terá que ver bem e convocar novas eleições, até porque se avizinha o final da época e era importante que se resolvesse rápido. O Coimbrões não tem a possibilidade como tem o Sporting de aparecerem logo cinco candidatos e resolvia-se o problema, porque há a necessidade de a transição ser feita com alguma rapidez, tendo em conta que estamos no final da época. É preciso reestruturar o departamento de futebol juvenil, não digo o de basket ou futsal, porque esses têm gestão à parte que está controlada, mas temos um problema com o futebol juvenil que é preciso reestrutura-lo, assim como o futebol sénior que necessita de ter seguimento, nas contratações, renovações e essas coisas. Esta direcção não o poderá fazer tendo em conta que de um momento para o outro se desencadeie uma eleição e as coisas poderão não ir ao encontro do que as novas pessoas que irão tomar conta do clube pretendem.


ABR - Por aquilo que percebi, ainda não há ninguém que se perfila-se para o suceder na presidência..

AL - Olhe, penso que o Presidente da Assembleia Geral ainda não fez muito por isso. Ainda não andou à procura. Esta semana penso que terá sido chamado à Câmara, mas não sei nada disso.


ABR - Se entretanto tiver alguma resposta positiva da Câmara, admite voltar atrás na sua decisão?

AL - Não. Isto tem que ir para eleições.


ABR - Mas nessas eleições admite recandidatar-se?

AL - Não. Neste momento não. Não quero dizer com isto que não possa fazer parte de um órgão qualquer. Não viro as costas ao clube. A minha vida profissional está a ser mais exigente e tenho alguma dificuldade, mas não viro a cara ao clube. Irei contribuir com aquilo que puder num outro órgão qualquer. Agora como presidente da direcção não. Este é um clube muito presidencialista. Tudo vem ter às mãos e tudo tem que ser resolvido pelo presidente.


ABR - O timing escolhido foi o mais correcto? Não pensa que isso irá abalar a equipa, tendo em conta que estamos perto do final da época?

AL - Não, porque a demissão foi feita, mas o clube continua a ser gerido no dia-a-dia. Por outro lado, não me parece que isto venha prejudicar o que quer que seja, porque as pessoas conhecem-me muito bem, os jogadores conhecem-me muito bem, sabem do que somos capazes. Isto tinha que ser feito agora porque foi a melhor altura. Se fosse muito perto do final da época teria outro problema, porque assim dá tempo para se resolverem outros assuntos e programar a próxima época.


ABR - Presidente, queria-lhe fazer uma pergunta relativa ao caso do jogo entre o Coimbrões e o Serzedelo, onde o clube foi acusado de tentar subornar o árbitro desse jogo. Isto porque em Janeiro deste ano saiu uma circular da FPF que penalizava o clube com pena de derrota e multa ao dirigente José Rocha Ribeiro e ao treinador da altura, António Remelgado. Que comentário faz desta situação?

AL - Olhe, por acaso queria-lhe dizer que o julgamento acabou hoje. Teve quatro ou cinco sessões, hoje estive lá como assistente, porque já tinha sido ouvido e agora haverá no próximo dia 8 de Abril as alegações finais. Aquilo que se provou e o que vi e me apercebi em tribunal, é que de facto aquilo que pensava e aquilo que fui sabendo depois de tudo isto, é que tudo foi feito à revelia da direcção. Não sei se vai ser provado ou não, mas é a realidade. Foi feito à revelia da direcção, as pessoas assumiram-no como tal, e como é óbvio não podia ser ao contrário, senão teríamos que ir para outra parte da justiça. Devo-lhe dizer que o Coimbrões apanhou 50% do castigo mínimo. Porque é que tinha que ser assim? Porque no regulamento do Conselho de Disciplina diz que o Coimbrões é responsável pelos seus empregados, dirigentes e treinadores. Agora, o Coimbrões não tem culpa rigorosamente nenhuma. O Coimbrões apanhou uma multa porque tinha os empregados ao seu serviço. O Vogal da direcção na altura apanhou seis meses de suspensão e o antigo treinador também. O outro senhor, que terá sido o mentor ou coisa parecida, agora só no tribunal civil é que poderá ser condenado, porque em termos desportivos ele não era nada ao clube nem dirigente de outro clube, logo não poderá ser castigado.


ABR - Acha que isso poderá ter alguma implicação directa para o clube, se a decisão for desfavorável ao Coimbrões. Até porque no Comunicado da FPF, o clube é punido com uma derrota que alteraria a classificação..

AL - Isso não tem nada a ver. O Campeonato foi homologado.


ABR - Não está em perigo então a equipa ser penalizada com descida de divisão…

AL - Não, não. O campeonato foi homologado. Agora chegou-se à conclusão de que ao Coimbrões poderá eventualmente ser-lhe subtraídos três pontos, como aconteceu com o FC Porto. Ainda não sei como funciona. Foi provada a inocência junto da FPF, arquivaram o processo, voltaram a abrir porque o Ministério Público não tinha enviado informação nenhuma. O Coimbrões foi, e tem que se provar em tribunal e penso que está provado, foi levado na onda porque houveram determinados indivíduos que chegaram perto do dirigente e estes caíram na esparrela e na armadilha, que foi bem feita. Deveria ser assim com todos.


Taça de Campeão Nacional:
Coimbrões é o único clube
do Concelho de Gaia a tê-la
na sua vitrine
ABR - Pensa que este clube, num futuro próximo, tem condições para disputar os campeonatos profissionais e ser a bandeira de Gaia?

AL - Não. Nestas condições actuais não. Por acaso desafiei o Sr. Vereador do Pelouro do Desporto e ele tinha um projecto que passava por ir buscar dois jogadores a cada clube e fazer uma Selecção de Gaia. Disse-lhe que não precisava de fazer isso. Pode pegar nesta equipa, porque está meio caminho andado. Este clube se ombreasse com a mesma capacidade que ombreiam a maior parte dos nossos adversários, teríamos com certeza alguns pontos de avanço para lutar pela subida. Mas não é essa a ideia. Não é impossível, mas se tivéssemos as condições ideais, ai sim, pois o clube tem organização. Como dizia à bocadinho, este clube tem-se portado muito bem e há quatro anos estava nos distritais sendo basicamente a mesma equipa e felizmente eles estão de parabéns.


ABR - Voltando às ajudas e apoios. Quais são os apoios que recebe então da Câmara?

AL - Zero. A nível financeiro zero. Logístico também não, infelizmente, pois estávamos a usar os autocarros da Câmara, mas estávamos a dever pouco mais de mil euros e cortaram-nos essa ajuda enquanto não pagássemos. Não pagamos.


ABR - Há pouco falou no passivo apresentado na Assembleia Geral. Qual é o valor desse passivo?

AL - O passivo apresentado no balanço foi de pouco mais de 40 mil euros. É o passivo neste momento, contando com a prestação todos os meses do pagamento dos balneários do polidesportivo que fizemos à nossa custa, sem um cêntimo de subsídio.


ABR - Qual foi o orçamento do clube para esta temporada?

AL - O orçamento do clube foi de cerca de 270 mil euros englobando todas as actividades.


ABR - Mas só para o futebol, qual foi o valor?

AL - Só para o futebol é sempre difícil, porque engloba muitas outras coisas, como os equipamentos, a água, a luz. Poderia-lhe dizer que não gastei cem mil euros em todo o futebol. Não tenho dúvidas que é o orçamento mais baixo da 2ª Nacional, porque os outros clubes têm outras armas que nós não temos. Se tivesse outras armas, este clube poderia ir longe. A dignidade de um clube não se mede pela divisão em que está, mas sim pela forma como sempre esteve no desporto.


ABR - Deixa o Coimbrões como Campeão da 3ª Nacional, único em Gaia a sê-lo. Qual foi o sentimento ao receber aquela Taça.

AL - Foi como todas as outras. Ganhamos aquela com a mesma dignidade com que ganhamos a da Divisão de Honra da AF Porto. Claro que esta tem outro significado por ter sido a nível nacional, pese embora não tivesse havido a poule final, pois cada um ganhou a sua série, acabamos por ser campeões com mais cinco equipas, mas recebemos esta Taça como tal. Foi um gosto muito grande, é um prazer, é o maior troféu que temos, de maior dimensão, não quero dizer que não tenha aqui outros com tanto ou mais valor do que aquele.

3 comentários:

Anónimo disse...

Boa noite
sou canidelense mas tenho com muito orgulho visto esta equipa gaiense e rival dado um grande show na 2ª divisão foi uma grande surpresa ver ascenção deste clube nos ultimos anos
agora com estas declarações que acredito que sejam verdade dou ainda mais valor a toda essa gente e muitos parabens espero que mantenham o nivel
PARABENS PARA EM ESPECIAL AOS CANIDELENSES PEDRO TAVARES; VITOR FONSECA; SERGIO e LOURENÇO

José Luis Freitas disse...

Parabéns Jonhny pela entrevista.

Grande presidente sem papas na língua, parabéns Sr. Armindo Lobato.

Só mostramos que se tivéssemos as mesmas condições (estádios) que outros ninguém nos segurava, e depois apareciam todos (presidente e vereadores) para as fotografias.

Enfim são os autarcas que temos na nossa cidade……….

MUITOS QUEREM POUCOS PODEM

josé adegas disse...

Como adepto antigo do Vilanovense, sou tb simpatizante do Coimbrões, tenho admirado muito o trajecto do clube, tal como o meu na década de 80, e compreendo as vossas queixas! a solução terá de ser, mais tarde ou mais cedo, a formação de um novo e grande clube, com outros apoios, para que Gaia finalmente tenha uma instituição desportiva à sua dimensão! haja fé nisso...e ideias!!!